EMÍLIA MENDES
(BRASIL – MINAS GERAIS)
Emília Mendes nasceu em São Gotardo, MG. É graduada em Letras — Língua e Literatura Francesas na Faculdade de letas pela UGMG.
Possui mestrado e doutorado em Estudos Linguísticos pela mesma universidade, onde atua também como professora.
Escritora de poucas vagas horas, publicou Cantigas de amores a ilustres senhores (1997), no projeto Poesia Orbital, do qual participou também como membro da comissão organizadora.
Desde 2000, faz parte do grupo de recitativo Los Borrachos.
ENTRELINHAS , VERSOS CONTEMPORÂNEOS MINEIROS. Organização: Vera Casa Nova, Kaio Carmona, Marcelo Dolabela. Belo Horizonte, MG: Quixote + Do Editoras Associadas, 2020. 577 p. ISBN 978-85—66236-64—2 Ex. biblioteca de Antonio Miranda
O poema, o poeta e a urbe
I
Este poema é irredutível ao ponto do desespero,
Ultrapassa a dor de meros angustiados versos,
Ulcera qualquer existência lhana e medíocre;
Este poema conhece o fremido frio dos ossos,
Os frangalhos das almas, o amargo do desterro.
O fel dos pesadelo e seu devir no arrebol;
Este poema é mais salubre que as lágrimas
Malditas que algum lábio já experimentou.
Mas é menos forte que qualquer obsessão suicida.
II
Eis-me aqui, o nobre poeta que chora a dor;
Somente o canto melancólico de um violino
Saberia traduzir a fiel melodia dessa solidão.
Este poema disforme irrompe em mim
Tédio, angústia, saudade, desprezo, pavor;
Temo que este tácito pavor me acalme.
Eu não sei desvencilhar-me do sentir e padeço
Diante desse campo minado da sensibilidade.
Dôo-te este sorriso putrefato em minha boca.
III
É nos movimentos dos carros que a urbe surde a dor.
A cidade assola nossas vidas pela peste endêmica que é.
A quimera dos que aí chegam, ela banqueteia famélica
E urge o amor, urge a beleza, urge a fantasia...
Onerosa, a monstruosidade atinge a todos,
Ousa o encanto existir senão na memória de poucos...
Estas chagas expostas da violência são intratáveis,
As moscas que nos rodeiam tatuam-nos suas larvas,
A urbe unde ad infinitum a dor desse lasso poetador.
O desprezo
Os mestres que venerava me traíram.
Minguados amigos que um dia tive,
Esquivos e impaciente, já se esvaíram
E não há inimigos que não os cative.
Encontro-me privado de tudo o que prezo.
Algésico, posso sentir, carcomendo sob a pele,
Esse verme indolente que desprezo.
Tal carcoma, nem impetuosas iras o repele.
Descri do que essa vida dita,
Desse engodo luzente que compus.
As trevas só me trouxeram a desdita,
A luz, o peso da sua cruz.
Genuflexo perante tamanha dor,
Do egoísmo, estou entre os dentes de chumbo.
Sou inconformado pela vaidade e pelo temor.
O mal é o outro: é só o que vislumbro.
O objeto
“O poema dever como a nódoa no brim:
Fazer o leitor satisfeito de si dar o desespero.”
Se quer ser grande, aborreça a todos, encolerize,
Provoque até a exasperação, dissemine destempero.
A literatura e os gêneros literários não se organizam mais em uma
mesma norma.
Contudo, esse jornalismo d´alma sem sentido, sem forma nem
cabimento.
Exige muita boa vontade, otimismo e empenho para pinçar um
mero entendimento.
Coitado do leitor, coitado dele! Coitado do crítico, coitado dele!
Interpretar, de que forma?
É por isso que dedico meu sofrimento à sua infelicidade,
Que você sofra um pouco e pare de escrever calamidades!
Chega de cópias sem reflexão, de modas já passadas, fanadas.
Escreva algo com opinião e originalidade, ou não escreva nada!
Não há como desconhecer a tradição; repudiar isso é engodo, ilusão.
Mesmo que você queira romper com tudo, que você negue tudo, diga
“não”,
É preciso conhecer o conteúdo deste “tudo”, do seu alvo de
revolução,
Sob pena de não romper com coisa nenhuma, só mais uma
pseudorebeldia em vão.
Poeta quer nunca estudou poesia é um desastre, um sofisma.
Crítico que nunca estudou outros críticos é um cataclismo.
Frutos da derrocada, repetem cretinamente a mesma cisma:
São vítimas da burguesia sem gosto, são vítimas do porco
capitalismo.
Entre o Ser &o Ter... gasta-se tanta energia em tentar parece ser
Que não sobra força criativa para escrever nem que seja uma pífia
poesia.
Entre o se & o ter... os ter venceu a batalha, dia a dia e por pura
ironia.
Eu tenho um livro, um blog, um site... mas só tem mesmo é apatia!
*
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Página publicada em maio de 2024.
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